Ornitologia e taxonomia na mídia!

Em época de valorização ampla e até fashion de zumbis e outros mortos-vivos assemelhados, segue um breve post pra manter meu bloguinho assim também: morto-vivo.

Abaixo vai uma reportagem recém-transmitida na TV Cultura com minha singela participação apresentando os trabalhos de taxonomia dentro da ornitologia (detalhes sobre o programa no final do post). Não deixem de ver também o segundo bloco, que descreve outros trabalhos com ornitologia executados por vários amigos e colegas.

O SP Pesquisa é um progama da FAPESP e TV Cultura numa cooperação para produzir reportagens sobre pesquisas científicas desenvolvidas em São Paulo com suporte financeiro da FAPESP. O programa é exibido todos os sábados às 16h na TV Cultura e aos domingos e quintas-feiras na Univesp TV. Mais detalhes estão aqui.

O Canal do programa no youtube com todos os demais episódios pode ser acessado diretamente clicando aqui. Vale muito a pena assistir todos eles.

#somostodosrepteis, disse o passarinho!

Este texto foi concebido e primeiramente rascunhado pelo meu amigo Hugo Fernandes-Ferreira, que depois me convidou pra contribuir e assinar com ele. O post original foi pensado pro site herpeto.org e pode ser acessado aqui. Como o tema central é, também, sobre aves, reposto o texto aqui.


 Autores:
         Hugo Fernandes-Ferreira. Biólogo, Doutorando em Zoologia pela UFPB. Sócio-proprietário da Ophian Consultoria Ambiental e Editor Assistente da Revista Gaia Scientia.
          Vitor de Q. Piacentini. Biólogo, Doutor em Zoologia pela USP. Diretor do Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos (CBRO) e blogger do ornitologo.wordpress.com.

Nos últimos dias, a campanha #somostodosmacacos suscitou inúmeras e polêmicas discussões em todo o mundo, referente ao racismo cometido contra o jogador Daniel Alves, do Barcelona, que se deparou com uma banana lançada por torcedores perto dele em uma partida na Espanha.

Em paralelo, houve discussões sobre a questão filogenética e etimológica sobre realmente sermos todos macacos (ou primatas, que seja). Sim, realmente somos.

Mas toda essa história nos remeteu a um outro fato interessante envolvendo a Herpetologia e a Ornitologia. Adiantando… O fato é que ou os répteis não existem ou todas as aves são répteis. Não entendeu? Vejamos então.

Eu, você, passarinhos, tartarugas, cobras, tuataras, jacarés e lagartos estamos num grupo chamado de Amniota. A principal característica dessa turma foi a conquista definitiva da independência da água para fins reprodutivos, graças principalmente à evolução do ovo amniótico. Ou seja, dentre os vertebrados, isso inclui todo mundo menos os peixes e anfíbios.

Conclusão número 1: Considerando que Herpetologia é o estudo de répteis e anfíbios, já vimos que, pelo conceito biológico e evolutivo, não faria sentido juntar esses grupos em um só escopo de pesquisa. Mas isso aconteceu, já que, historicamente, os métodos de coleta e estudo para os dois grupos são muito parecidos.

A outra questão é que eu, você e os demais mamíferos estamos separados dos demais animais em uma linhagem chamada Synapsida, porque temos como condição ancestral somente uma abertura no osso temporal do crânio, enquanto o restante (ou pelo menos seus ancestrais) possuem os ossos tabular e supratemporal ausentes ou muito pequenos e são chamados de Sauropsida. Você pode achar estranho o fato de apenas buraquinhos no crânio separarem animais em grupos tão distintos, mas, acredite, essas fossas craniais são muito importantes para uma série de caracteres morfológicos como inserção de músculos, articulação de ossos e desenvolvimento cerebral.

Então, até aqui, o que precisamos entender é que mamíferos (Synapsida) estão em um grupo separado do que chamamos popularmente de aves e répteis (Sauropsida).  Agora, vamos estudar somente os Sauropsida.

Olhe bem para o cladograma abaixo (para melhor resolução, clique na figura). Note que esse táxon se divide em dois grupos: Diapsida, que inclui animais com duas aberturas temporais (aves, lagartos, tuataras, serpentes e jacarés) e Anapsida, que abrange animais sem essas aberturas (todos os quelônios).

Somostodosaves

Conclusão número 2: Aprendemos desde cedo que répteis são os vertebrados terrestres escamados (serpentes, lagartos, tuataras), os crocodilianos (jacarés, crocodilos e gaviais) e os quelônios (tartarugas, cágados e jabutis), correto? Pois bem, biologicamente, essa definição está “errada”. Se seguirmos à risca uma definição biológica baseada em grupos “naturais”, não seria adequado juntar todo mundo no mesmo barco. As tartarugas representam uma linhagem evolutiva completamente diferente e muito mais antiga do que o restante desses animais, além de terem morfologia bastante divergente também. Sabemos também, por fósseis, que já existiram várias linhagens evolutivamente muito mais próximas dos demais répteis do que as tartarugas.

A figura acima também nos mostra o que seria mais surpreendente para a maioria do público leigo. Aves e crocodilianos são “parentes próximos”. E é verdade. Eles fazem parte de um grupo chamado Archosauria, pois ambos possuem uma fenestra anterior à órbita do olho como condição ancestral. Sabe quem mais fazia parte desse grupo? Os dinossauros. Por isso é que você já deve ter ouvido falar que galinhas são dinossauros vivos.

Conclusão número 3: a única forma de aplicar o termo “réptil” de forma biologicamente correta seria reunir todos eles em um conjunto só (grupo monofilético, ou seja, com um ancestral comum exclusivo). E o único que envolve tartarugas, jacarés, cobras e lagartos seria o dos Sauropsida, que também envolve as aves. Se excluirmos as aves desse conceito e incluirmos as tartarugas (como todo mundo faz), o nome “réptil” representaria um grupo parafilético, ou seja, que consiste na reunião de táxons de vários grupos distintos, que não compartilham um ancestral diretamente comum. E os grupos parafiléticos são desprezados em estudos evolucionistas. Portanto, aves são répteis. Ou então, répteis (sem aves) não são um grupo natural.

Mas não se preocupe, você pode continuar reunindo na palavra “réptil” os animais que você aprendeu desde cedo como tal (serpentes, lagartos, crocodilianos e quelônios). Mesmo porque, é inclusive um termo utilizado informal e formalmente pelos cientistas. Obviamente, toda essa discussão foi apenas para que você mergulhasse um pouco mais na complexidade dos conceitos evolutivos e também nos paradoxos entre Ciência e Sociedade. E se algum ornitólogo falar que também é herpetólogo, não se surpreenda. Ele estará correto!

E se dissermos agora que os répteis deveriam ser chamados de aves? Confundiu tudo, né? Mas vamos lá.

É possível, em verdade, nos aprofundarmos muito mais nessa questão filogenética e de grupos naturais. Uma vez que todos os organismos vivos possuem como código genético uma mesma estrutura de DNA, construída com as mesmas moléculas, acredita-se que toda a vida neste planeta surgiu de um único ancestral primordial. E que, ao longo da evolução, as linhagens de organismos foram ramificando sucessivamente, tal qual os galhos de árvore. Aliás, o uso metafórico de árvore é tão útil que não foi à toa que Darwin sugeriu originalmente uma árvore da vida! Podemos, frente a uma árvore, nos perguntar se duas folhas quaisquer estão no mesmo galho. A resposta vai depender do que consideramos “um galho”. Nos cladogramas filogenéticos ocorre a mesma coisa: dizer que dois grupos de organismos pertencem a um mesmo grupo natural vai depender de onde fizermos o corte do galho. O ponto central é que não dá pra reunirmos apenas parte das folhas de um galho excluindo algum ramo que cresceu posterior à nossa linha de corte.

#somostodosmacacos é uma hashtag evolutivamente correta. Mas igualmente podemos pensar em #somostodoshominídeos (fazendo um corte mais exclusivo), #somostodosprimatas (num corte mais inclusivo, abarcando lêmures, társios, etc.), #somostodosmamíferos (ainda mais inclusivo) e – pasmem – podemos pensar até em #somostodospeixes! Sim, somos mesmo! Ou melhor, depende da definição de “peixe”. Similar ao exemplo acima dos répteis, também os peixes, tal qual os definimos popularmente, são um grupo artificial formado por várias linhagens independentes e que, dentro do raciocínio de galhos/ancestrais comuns, só podem ser reunidos num grupo natural se incluirmos todos os demais vertebrados – incluindo nós mesmos! [ver também este outro texto aqui] Pois é, aquele salmão do sushi evolutivamente tem mais em comum com um beija-flor ou um rato (ou nós) do que com o cação da moqueca ao lado.

Por fim, uma nota nomenclatural: na Zoologia, a prioridade entre dois nomes aplicáveis a um táxon (seja espécie, gênero ou qualquer táxon superior) é dada pela data de criação do nome. O nome mais antigo tem prioridade. Assim, na hora de “traduzir” uma filogenia para a nomenclatura zoológica, não importa se o nome AAA é baseado em organismos de um clado mais exclusivo (ou seja, “dentro”) que compõe um clado maior que inclui organismos nos quais se baseia o nome BBB. Se o nome AAA é mais antigo, é ele que deve ser usado. E então voltamos às aves. Existem aves e Aves, e são coisas diferentes! Aves, de maneira geral, é o termo corriqueiro, popular, que usamos pros animais cobertos de penas. Mas existe o termo científico Aves, que é o nome de uma classe (táxon) criada por Linnaeus em 1758. Nessa mesma obra, Linnaeus também cria o termo Reptilia (do qual deriva a palavra répteis). Mas Reptilia originalmente não era uma classe, e sim uma ordem dentro da classe Amphibia! Portanto “Aves”, por ter sido aplicado originalmente num nível hierárquico maior, teria prioridade (princípio do artigo 24.1 do Código Internacional de Nomenclatura Zoológica). Ou seja, numa classificação que considere os “répteis” e as aves como um mesmo táxon (dentro do sistema lineano),  o nome deve ser Aves! Então mesmo que o passarinho do título deste texto tenha dito #somostodosrepteis, do ponto de vista nomenclatural  os répteis é que precisariam dizer #somostodosAves!

Herpeto.org, um site de anfíbios e répteis… Ou seja, de aves… Ou seja, de peixes.


Homem é tudo igual? O curioso fenômeno do heteroginismo

Por Vítor de Q. Piacentini

Se por um acaso você, cara leitora [ou leitor, né? Século 21, sem preconceitos], brigou com o namorado e, num momento de raiva, chegou neste singelo blog ao procurar no Google textos que sustentem a tese de que “homem é tudo igual”, que “homem nenhum presta” [mentira], etc., etc., receio que você ficará decepcionada(o), já que aqui trato de passarinho (passarinho passarinho!). Ou não! De repente você descobre que o universo das aves é superinstigante e passa a curtir os bichos, não é mesmo? Na dúvida, leia até o final, já que alguns comentários aqui versarão sobre comportamento e seleção sexual. E isso pode ser interessante pra você neste momento. [No mínimo vai dar uma acalmada] 🙂

Hoje falarei de heteroginismo… Mas não se preocupem, podemos falar de heteroginismo com a certeza de que bolsonaros e felicianos não nos incomodarão.


Na primeira metade do século passado, mais ou menos quando nossos avós ou bisavós eram crianças, um respeitável senhor austríaco a quem muito admiro – ninguém menos que Carl E. Hellmayr (1878-1944), talvez o maior ornitólogo de aves neotropicais – trouxe à tona um padrão muito peculiar de diferença de plumagem entre alguns papa-formigas (aves da família Thamnophilidae). Hellmayr notou que, para alguns grupos de espécies ou subespécies, os machos eram todos muito parecidos ou mesmo idênticos, enquanto que as fêmeas das espécies é que diferiam entre si (e permitiam reconhecer que eram entidades distintas).

Esse padrão é pouco comum e muito curioso. Via de regra, o que notamos nos animais é que, quando as espécies apresentam dimorfismo ou dicromatismo sexual, a seleção sexual tende a exacerbar traços morfológicos nos machos. É isso que faz com que pavões, faisões, aves-do-paraíso, alguns beija-flores e mesmo nossos tangarás (Pipridae) e anambés (Cotingidae) sejam tão belos, por vezes até psicodélicos. Aliás, a seleção sexual pode ser uma grande mola propulsora do processo de especiação, “gerando” caracteres que passam a diferenciar populações/espécies aparentadas a partir de um ancestral comum. Mas em todos esses casos, o padrão clássico é que machos sejam vistosos e diferentes, enquanto as fêmeas são discretas e, comumente, bastante parecidas entre si. Isso é exemplificado nas aves brasileiras pelos padrões de plumagem dos anambés dos gêneros Cotinga, Xipholena e Procnias (aqui e adiante, sempre comparando as espécies e subespécies dentro do mesmo gênero, claro), pelos tangarás dos gêneros Lepidothrix, Chiroxiphia, Pipra e Ceratopipra, pelos papa-capins do gênero Sporophila (especialmente os caboclinhos), por beija-flores como Thalurania e Heliomaster, nos gaturamos Euphonia, em pares de espécies como os beija-flores Lophornis magnificus e L. gouldii, as saíras Hemithraupis guira e H. ruficapilla, etc. Há um sem-número de casos e um leitor ornitólogo mais atento certamente conseguirá lembrar de outros mais que eu não citei. Mais importante, todos eles são compreensíveis quando se pensa em seleção sexual.

Justamente por ser algo recorrente e, principalmente, entendível com alguma facilidade numa perspectiva evolutiva, esse padrão de diferenças de plumagem não nos espanta. O que chama a atenção é justamente quando acontece o oposto, o que, como mencionado acima, foi descrito por Hellmayr: fêmeas são distintas e machos são iguais. O heteroginismo!

Como explicar o heteroginismo? Como eu disse, esse fenômeno é especialmente comum em papa-formigas. Um caso clássico são os olhos-de-fogo (gênero Pyriglena), em especial os do grupo leuconota. Nesse grupo, os machos de todos os táxons são completamente negros e idênticos entre si, ao passo que as fêmeas podem ser bastante distintas. Basta o leitor comparar fotos de machos e fêmeas (p.ex. no Wikiaves) para apreciar o fenômeno. Pra facilitar a diferenciação das fêmeas, posto abaixo uma foto de espécimes de museu (que permitem uma visualização mais adequada, já que todos ficam sob uma mesma exposição de luz).

Pyriglenas2

Exemplares fêmeas (peles científicas) de Pyriglena do grupo leuconota em vista ventral, lateral e dorsal. Da esquerda para a direita: P. l. maura (do Pantanal e arredores, com supercílio claro); P. l. similis (entre os rios Tapajós e Xingu, com o corpo escuro e cabeça preta); P. l. interposita (entre o Xingu e o Araguaia-Tapajós, com fronte cinza); P. l. leuconota (a “verdadeira”, a leste do Araguaia-Tocantins); e P. pernambucensis (na Mata Atlântica da PB a AL, com ventre escuro e oliváceo). Diferenças de tamanho, forma e exposição do branco interescapular são artefatos da preparação dos espécimes. Todas essas subespécies são fortes candidatas a serem tratadas como espécies independentes de P. leuconota num futuro próximo, tal qual recentemente adotado para P. pernambucensis (© Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo/V.Q.Piacentini).

No trabalho original em que descreve o heteroginismo, Hellmayr cita ainda como exemplos os gêneros (às vezes o gênero todo, às vezes um ou outro caso em) Thamnophilus, Dysithamnus, Thamnomanes, Myrmotherula, Cercomacra, Schistocichla (= atual Myrmelastes), Myrmoborus e Willisornis. Mas o trabalho fica só na descrição. Em nenhum momento é sequer especulado um mecanismo que poderia estar por trás desse fenômeno, o que nos deixa um mistério. O que poderia gerar esses padrões?

Foi o grande biólogo do século XX (e ornitólogo!) Ernst Mayr quem primeiro (e unicamente?) sugeriu uma explicação para o fenômeno. Em seu livro Systematics and the Origin of Species, from the Viewpoint of a Zoologist, de 1942, Mayr propõe que, por ocorrer tipicamente em espécies nas quais o macho é preto ou muito escuro, o heteroginismo resultaria de uma intensidade de pigmentação que está acima do limite em que a formação das cores das aves conseguiria ser influenciada (por pressões seletivas/evolutivas). Particularmente, não gosto dessa hipótese. Mayr discutiu o heteroginismo nesse livro ao alertar sobre sua ocorrência fora dos papa-formigas, especificamente no grupo de subespécies de Pachycephala pectoralis das Ilhas Salomão. Acontece que, se a explicação de Mayr fosse satisfatória, ou seja, se os machos de P. pectoralis tivessem uma saturação de pigmentação, então não deveríamos encontrar diferenças entre machos de grupos distintos dentro dessa mesma espécie! Ou seja, o heteroginismo deveria valer pra todos os grupos de subespécies de P. pectoralis, não para apenas um. Neste caso, a exceção à regra seria preponderante sobre a regra em si!

Pachycephala_pectoralis_-_Risdon_Brook

Macho de Pachycephala pectoralisJJ Harrison, licensed under Creative Commons).

Tentei pensar em explicações alternativas, sem sucesso. Perguntei a alguns de meus gurus da biologia evolutiva, como meu amigo Fábio Amaral, que inclusive lembrou de outra exceção à hipótese da superpigmentação: o par Myrmoderus (ex-Myrmeciza) squamosus x loricatus. Neste par de papa-formigas, machos são mais parecidos entre si do que as fêmeas, muito mais distintas (compare imagens aqui e aqui). Não chegamos a um consenso. A explicação “esperada” seria talvez uma dominância das fêmeas nessas espécies, com machos atuando numa seleção sexual das parceiras – o inverso do que vemos em exemplos clássicos de seleção sexual, mas não consigo ver evidências disso em campo. Quem já fez playback para esses papa-formigas pode ter percebido que a regra é o macho do casal ser o primeiro a se aproximar para defender o território.

Ou talvez não estejamos prestando a devida atenção aos sinais. Eu estava há quase seis meses com esse texto incompleto até que nesta semana resolvi finalizá-lo. E na última sexta-feira (11/abril), por coincidência, meu amigo e colega Vagner Cavarzere, que está finalizando seu doutorado com o gênero Cercomacra (+Cercomacroides), comentou sobre um trabalho que mostrava que fêmeas de C. tyrannina também defendem território sozinhas (tal qual machos), o que permite conjecturar que, ao menos em alguns casos, os machos possam circular pelos arredores e também escolher as parceiras! Teríamos agora um norte para tentar explicar o heteroginismo?

Um fato intrigante que me veio à cabeça é que há certo heteroginismo em algumas situações na nossa própria espécie: casamentos e festas (ex. cerimônia de entrega do Oscar). Os homens com ternos e afins, sempre muito parecidos entre si (e usualmente em preto ou tons escuros), ao passo que as mulheres mostram uma variação muito maior em formas e cores de seus trajes. Mera coincidência? Qual a razão disso?

Infelizmente temos muito mais perguntas do que respostas e até hoje o mecanismo por trás do heteroginismo não é compreendido. E mais curioso, na minha opinião, é que ninguém nunca mais pesquisou o fenômeno. O fato é que, na próxima vez que você ouvir alguém falando que homem é tudo igual, lembre-se: ao menos em alguns casos, a pessoa pode estar correta.

 


Comentários adicionais:

– Eu sempre tive dúvida quanto à tradução do termo: heteroginia ou heteroginismo? (no original em inglês, heterogynism). Em uma pesquisa rápida, encontrei apenas três usos do termo em português: no livro de Helmut Sick (1997. Ornitologia Brasileira), por duas vezes aparece a palavra heteroginia, enquanto heteroginismo aparece uma vez. Embora eu não encontrasse argumentos para validar uma ou outra forma, eu estava propenso a defender o uso de heteroginismo, já que outros fenômenos ligados a variação de “aparência” também fazem uso do sufixo –ismo: dimorfismo, dicromatismo, albinismo, melanismo… Daí que semanas depois encontrei num livro de termos científicos, por outra pura coincidência, uma explicação: o sufixo –ia é usado para expressar uma ação, enquanto –ismo é utilizado para o resultado de uma ação. É praticamente uma diferença de causa x efeito. Assim, o mais adequado para nomear esse padrão de diferenciação de plumagem é mesmo heteroginismo (e o ato de gerar a diferenciação de fêmeas em detrimento de machos seria a heteroginia).

– Em muitos trabalhos, o nome de Carl Eduard Hellmayr aparece “traduzido” para o inglês, “Charles E. Hellmayr” – isso é especialmente verdade após Hellmayr ter sido contratado para trabalhar no Field Museum of Natural History, em Chicago. Uma foto de Hellmayr pode ser vista no belo obituário escrito por John Todd Zimmer (1889-1957), ornitólogo do American Museum of Natural History e talvez meu ídolo maior na taxonomia de aves (ou talvez empatado com o Hellmayr). O final do texto, em particular, me inspira e emociona. Zimmer destaca que o Catalogue of the Birds of the Americas foi a obra maior de Hellmayr, mas que é apenas um ícone maior dentre os muitos trabalhos feitos por ele, todos “prepared with the same rigorous search for fundamental truth” [grifo meu]. E poeticamente finaliza dizendo que “the monument, built with his own hands, needs no further adornment”.

aves-do-paraíso

Meu primeiro contato com as aves-do-paraíso foi na infância, ao ganhar um livro sobre a Nova Guiné. Fiquei vidrado na diversidade de formas e cores desses bichos, não à toa: são talvez o grupo mais espetacular de aves no mundo. Enquanto não termino o próximo texto do blog, segue aquele videozinho clássico que todo mundo já viu mais de uma vez [eu, talvez entre 15 e 20 vezes!] mas que nunca cansa. Só pra manter o blog vivo enquanto lapido as novas ideias. E pensar em seleção sexual vai ajudar na hora de ler um dos futuros posts também.

Quem tiver tempo livre ou for adepto da procrastinação, não esqueça de dar uma olhada na página do projeto também – tem outros vídeos lá, todos espetaculares: http://www.birdsofparadiseproject.org/

— Caramba! Por uma “grande” [antes tinha um palavrão aqui] coincidência, fui buscar uma citação do Alfred Russel Wallace a respeito das aves-do-paraíso, já que ele foi um dos primeiros naturalistas a “estudar” essas aves e por estarmos justamente no mês que marca o centenário da morte deste notável cientista, e descobri que justo amanhã [12 novembro], no American Museum of Natural History, vai ter uma palestra sobre isso capitaneada por ninguém menos que Sir David Attenborough! [Piiiiiiiiiiiiiiiiii – outro palavrão!] Que evento dos sonhos: conseguiram juntar Wallace, Sir Attenborough, AMNH e aves-do-paraíso de uma única vez! Eu só lamento morar tão longe de Nova Iorque. Sem palavras!

Crônica: Quando o beija-flor é flor!

Por Vítor de Q. Piacentini

Eu ainda lembro como se fosse hoje. Mal principiara novembro de 2005, um dia de sol, intervalo do almoço dentro do excelente XIII Congresso Brasileiro de Ornitologia, em Belém do Pará. Na saída do restaurante, o Prof. Luís Fábio Silveira – que viria a ser meu orientador do doutorado – me perguntou: “Por que você não faz a tese com uma revisão [taxonômica] dos Phaethornis?”

Phaethornis é um dos maiores gêneros de beija-flores existentes (em número de espécie, não em tamanho corpóreo), conhecidos genericamente por “rabo-branco” ou ermitão (uma tradução direta do nome inglês, hermit). Mas se você ainda não os conhece e está agora com aquela imagem mental de um passarinho* delicado e coloridinho suspenso no ar, pare imediatamente. Os Phaethornis não têm nada de colorido! Mas nem por isso são menos interessantes.

Mês passado foi publicado um trabalho que, embora “neonatal”, já pode ser chamado de um clássico: “Uma introdução ao esqueleto dos beija-flores num contexto funcional e filogenético”. Autorado pelo Dr. Richard Zusi, de 83 anos e curador emérito (aves) do Smithsonian Institution, é uma obra monumental. Quem é da área fica mesmo impressionado, por mais que a tradição de bons trabalhos pelo Dr. Zusi devesse nos deixar preparados para obras de qualidade. Ainda não tive tempo para terminar de ler o trabalho, mas um aspecto da obra deteve minha atenção: o estreptognatismo dos beija-flores. É dele que vou falar neste post, um pouco mais técnico do que o anterior.

Estreptognatismo é a capacidade de deslocar lateralmente os ossos da mandíbula, alargando a base do bico. Quem me ensinou esse termo foi meu colega e amigo Guilherme Brito, do blog CurioZoo [cuidado, ele às vezes usa uma linguagem mais forte. Mantenha fora do alcance de crianças ;-)]. E o motivo foi uma foto de outro amigo nosso, o renomado ornitólogo, guia e fotógrafo Ciro Albano. Durante uma viagem à Bahia, Ciro notou que os machos de Phaethornis margarettae – uma espécie ameaçada de extinção – alargavam a mandíbula de maneira a ressaltar sua base vermelha durante sua exibição nupcial (se é que se pode chamar de exibição). Muitos beija-flores, notadamente os Phaethornis, possuem sistemas de acasalamento no qual os machos congregam-se em “arenas” (leks) de exibição onde passam boa parte do dia cantando, cada macho alternando entre dois ou três poleiros preferenciais num ponto distante o suficiente de outros machos para manterem apenas contato auditivo, sem contato visual. Eu falei que Phaethornis eram interessantes!

A foto do Ciro é esta aqui em baixo, e fala por si só:

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Foto rabo-branco-de-margarette (Phaethornis margarettae) por Ciro Albano | Wiki Aves – A Enciclopédia das Aves do Brasil.

Quando a vi pela primeira vez, imediatamente pensei: “Nossa, que p***** é essa? Parece uma pétala. E de Masdevallia. Espetacular!!!!” Pois é, sempre que revejo esta foto, esse bico me remete a uma pétala (sendo tecnicamente preciso, neste caso seria uma sépala) de alguma orquídea do gênero Masdevallia, como nessa foto minha, abaixo.

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Tudo bem, minha foto não está das mais didáticas, então vejam fotos de Masdevallia veitchiana no Google imagens aqui.

Os impressionantes vídeos do Ciro, abaixo, mostram um macho de Phaethornis margarettae se exibindo.

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Esse comportamento sensacional não é exclusividade de Phaethornis margarettae, já tendo sido observado em pelo menos quatro outras espécies do gênero. E o Dr. Zusi faz uma pequena revisão a respeito do tema no seu trabalho. Aliás, apenas nos Phaethornis o estreptognatismo é usado em exibição nupcial. Em outros beija-flores, um estreptognatismo mais sutil (bem mais sutil!) pode ser observado enquanto as aves bebem néctar. Também aves insetívoras, como barucaus, podem realizar o estreptognatismo para capturar suas presas. Sem falar nos pelicanos, um exemplo clássico desse comportamento (mas não confundam com o alargamento da pele do mento e da base da mandíbula).

Curiosamente, beija-flores nunca estiveram entre minhas aves favoritas (curto muito mais as bandeirosas saíras). A maioria dos contatos que temos com eles no campo mal permitem uma visualização, quanto mais uma identificação da espécie, embora ouvidos e olhos mais treinados possam reverter esse quadro desfavorável. Essa dificuldade de identificação acabou sendo um desestímulo pra minha empatia com essas aves. Mas quis o destino que eu viesse a trabalhar com beija-flores tanto no mestrado como no doutorado, ainda que em projetos totalmente desconectados.

Ao ouvir aquela proposta, em novembro de 2005, fiquei pensando se realmente eu gostaria de trabalhar outra vez com beija-flores. Foi quando o Prof. Mario Cohn-Haft, do INPA, que nos acompanhava, comentou: “Esse é um projeto muito legal, alguém precisa desfazer a bagunça que está a taxonomia dos Phaethornis”. Esse comentário – confidenciei ao Mario na última vez em que nos encontramos – foi definitivo pra eu aceitar o desafio. E ali, naquele momento, eu comecei a desmontar meu preconceito contra os beija-flores.

Hoje acho beija-flores bem interessantes, claro, em especial os Phaethornis em suas vestes discretas de cinzas e marrons. E então meu amigo Ciro me traz essas imagens espetaculares, pura arte, dos Phaethornis revelando um colorido escondido e uma complexidade de comportamento e forma que supera muito do que eu tinha em mente. Ao formar essa “pétala”, é como se o beija-flor invertesse seu papel na natureza e, para atrair as fêmeas, se fizesse flor.

Zusi, Richard L. 2013. Introduction to the skeleton of hummingbirds (Aves: Apodiformes, Trochilidae) in functional and phylogenetic contexts. Ornithological Monographs, 77(1): 1-94. doi:10.1525/om.2013.77.1.1

Comentários adicionais:

* Beija-flor é passarinho? Tem gente que defende que somente as aves Passeriformes deveriam ser chamadas de “pássaros”, comumente disseminando que “todo pássaro é uma ave, mas nem toda ave é um pássaro”, tal qual eu mesmo já fiz. Só que o uso comum das palavras “ave” e “pássaro” é totalmente intercambiável e as duas palavras são sinônimos, tanto que esse sentido já está dicionarizado. Se tiverem acesso, busquem ler o ótimo texto do meu amigo Fernando Straube “Todas as aves são pássaros”, publicado na revista Atualidades Ornitológicas v. 148, p. 4-6, 2009.

– As arenas dos beija-flores se mantêm “estáveis” durante muitos anos, mesmo décadas. Obviamente que os indivíduos mais velhos vão morrendo e seus espaços vão sendo ocupados por novos indivíduos. Mas a localização de uma arena de Phaethornis, se não houver nenhum distúrbio, tende a ser a mesma ao longo do tempo. E a atividade nessas arenas ocorre ao longo de praticamente todo o ano, embora mais intensa em algumas épocas. Eu mesmo já visitei lugares indicados por amigos que haviam descoberto as arenas 5, até 20+ anos antes (p.ex. Reserva da Vale, em Linhares).

– Um dos beija-flores mais enigmáticos do mundo é o “Bogota Sunangel”, batizado cientificamente de Heliangelus zusii justamente em homenagem ao Dr. Zusi. Essa espécie é conhecida por um único exemplar coletado possivelmente no leste dos Andes colombianos em 1911, em local desconhecido. Ninguém nunca encontrou essa espécie na natureza e muitos temem que possa estar extinta pelo desmatamento. No fim de 2011 algumas aves parecidas foram localizadas ao norte de Bogotá; estudos em andamento, incluindo análises genéticas, dirão se é mesmo a misteriosa espécie.

– Sempre que penso na palavra “pétala”, lembro da música do Alceu Valença, que traz na letra beija-flor, flor e até lagarta! Fica de trilha sonora: http://grooveshark.com/s/P+talas/3TeTcg?src=5

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O sabiá nosso de cada dia… ou noite!

Por Vítor de Q. Piacentini

Nas duas últimas semanas, aproximadamente, uma simpática ave virou notícia nas mídias impressas e principalmente internéticas do Brasil, com especial referência a São Paulo: o sabiá-laranjeira. Para nossa (= de quem curte aves) tristeza, o simpático sabiá não era aclamado por seu melodioso canto – pelo contrário: o bichinho tá literalmente tirando o sono de muita gente! Entre brincadeiras e ameaças de morte, muitas pessoas se manifestaram incomodadas com o canto de madrugada do sabiá. Aqui em São Paulo ele começa a cantar em alguns lugares por volta das 3h da manhã, acordando alguns de seus vizinhos cedo demais. Eu, que também odeio acordar cedo, entendo o ponto de vista desses reclamões. Mas considero uma injustiça, e é por isso que estou escrevendo este texto.

Fato é que no Brasil costumamos reclamar sem nem saber direito os porquês. Afinal, o que está acontecendo? De quem é a culpa pelo sono interrompido? O Sakamoto, em seu muito bom blog, relatou os fatos. O pai do João, o Sr. Helio, apresentou soluções criativas, ainda que a primeira delas não seja tão saudável! E a Folha de São Paulo buscou levar mais informação aos seus leitores, embora infelizmente confiando em algumas informações sem respaldo científico.

Assim como muitas outras aves, o sabiá-laranjeira inicia sua temporada reprodutiva após o inverno e é através do canto que o macho atrai suas parceiras e demarca seu território, como informado à Folha pelo amigo Márcio Repenning. E é por isso que nesta época começam as cantorias pré-matinais. A informação do Sr. Dalgas Frisch [de quem respeitosamente tenho todas as objeções possíveis] de que os machos estão cantando para ensinar os filhotes não tem qualquer embasamento. Aliás, no início da estação reprodutiva, quando se espera a maior atividade vocal das aves, os filhotes ainda nem nasceram. E só nascerão se os casais parearem, e é justamente pra parear que os machos agora cantam! Há portanto uma óbvia inconsistência causo-temporal naquele argumento. Todavia, a função do canto do sabiá explica apenas uma parte dos fatos [por que eles cantam?], mas não a que mais interessa aos insones das metrópoles: por que às 3h da manhã? E é aqui que vem a parte mais legal de toda essa história. Os sabiás-laranjeira estão cantando assim cedo em São Paulo (e também Porto Alegre, Cutitiba e outras cidades) mas NÃO nas áreas florestadas onde a espécie também ocorre! Como assim? Não é primavera em todos esses lugares??? Pois é, quem mora em sítios ou também na borda de maciços florestais e presta atenção nas aves ao seu redor já notou que a primavera chegou e que os sabiás estão cantando. Mas iniciam a cantoria apenas quando começa a clarear o dia! Pra inveja de muitos!

O que faz os sabiás iniciarem a cantoria tão cedo nas cidades? Quem conhece um pouco da biologia das aves sabe que elas têm seu metabolismo influenciado pelo fotoperíodo do dia [o tempo total de claridade que um dia qualquer apresenta – maior no verão, menor no inverno, como quase todo mundo sabe]. Logo, o impulso inicial é pensar que a iluminação artificial está fazendo os sabiás acordarem mais cedo. Só que essa explicação não é de todo satisfatória, já que a iluminação artificial está igualmente disponível após o pôr-do-sol, porém os sabiás vão dormir nessa hora. Além disso, se apenas a luz fosse um estímulo pros sabiás, seria esperado que eles continuassem ou até aumentassem a cantoria no restante do período claro do dia. Mas isso não acontece. Algo mais deve estar acontecendo.

A resposta exata pro despertador paulistano soar às 3h da manhã eu infelizmente não tenho. Mas calma! Não fiz vocês lerem até aqui pra assumir que não sei e pronto. Nós ornitólogos temos sim uma boa pista. Meu amigo e colega Rafael Marcondes excelentemente lembrou de um trabalho feito na Inglaterra com uma outra espécie de ave, mas cuja história de cantoria em cidades é muito parecida. E o que nossos colegas europeus descobriram é que o principal fator influenciando o horário de cantoria da passarada urbana é o barulho das cidades! Tal qual pra todas as demais espécies – incluindo a nossa própria – sexo é muito importante, quase que um objetivo de vida. E, conforme falei acima, é cantando que os machos conseguem suas parceiras. Mas como os sabiás têm seus territórios, os machos precisam cantar para as fêmeas ao mesmo tempo em que precisam ficar numa mesma área para evitar que outros machos tomem seu lugar. Dessa forma, quanto mais longe seu canto chegar, maior a chance de uma fêmea escutar e se interessar por ele. E com todo o barulho das cidades, qual seria o momento do dia em que um sabiá macho consegue disseminar mais longe (e com maior chance de sucesso) a “informação sonora” de sua presença em determinado território? Exatamente, caro leitor: no horário em que a cidade é mais silenciosa (ou menos barulhenta, no caso de São Paulo)! O sabiá só faz aquilo que nós mesmos fazemos. Ou você (leitor homem) nunca chamou uma menina no meio de uma festa pra ir “lá fora” ou “naquele canto mais calmo” pra poder conversar com ela mais tranquilamente? No mínimo você já se afastou de um ambiente barulhento pra atender um telefonema e assim facilitar a comunicação. E é só isso que os sabiás estariam fazendo. Se existe um culpado pelo horário em que os sabiás citadinos estão acordando, somos nós. Tudo isso posto, penso que apenas um fator ainda carece de uma explicação satisfatória: por que algumas poucas pessoas não conseguem apreciar um canto melodioso de um sabiá?

Comentários extras:

– Quem quiser conhecer mais sobre o sabiá-laranjeira, “o terror das madrugadas paulistanas”, pode ver fotos e ouvir cantos da espécie aqui.

– Ao contrário do divulgado por algumas pessoas e inclusive repetido no site do Wikiaves referenciado acima, o sabiá-laranjeira NÃO é ave-símbolo do Brasil. O Brasil não tem uma ave-símbolo oficial. Conforme pode ser lido por qualquer pessoa, o texto do Decreto Presidencial de 3 de outubro de 2002, que institui o “Dia da Ave”, diz apenas que o sabiá[-laranjeira] (Turdus rufiventris) será o “centro de interesse para as festividades do Dia da Ave”. Em breve publicarei um texto detalhado sobre isso, já que o decreto menciona por cima ser o sabiá “popularmente Ave Nacional”, levando os menos atentos à confusão. Mas, pra bom entendedor, “me.. pala… bas..”.

– Gonçalves Dias, ao compor os versos clássicos de sua Canção do Exílio (“Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá”) muitíssimo provavelmente fazia alusão ao sabiá-barranco (Turdus leucomelas), espécie de sabiá até hoje abundante (e a mais comum, de acordo com o amigo Firmino Filho) em Caxias, na região dos “cocais” [olha aí as palmeiras!] do Maranhão, terra natal do aclamado poeta. O sabiá-laranjeira, por outro lado, não é conhecido de Caxias, ainda que ocorra não muito longe dali.

Atualização: o amigo Sandro von Matter (to cheio de amigos – que bom!) leu o post e me indicou um segundo trabalho, também feito na Europa, que mostra que o barulho das cidades afeta o horário em que os bichos cantam. Mas o mais legal é que esse segundo trabalho, publicado agora em agosto, lida com um parente mais direto do nosso sabiá-laranjeira: o Turdus merula.